quarta-feira, 3 de setembro de 2008

JÚLIO FRANK, O HOMEM QUE TEVE DOIS TÚMULOS

Júlio Frank


Quem trouxe a mensagem e o ideal liberal para o Brasil? Quem criou a sociedade secreta Burschenschaft na velha Faculdade de Direito de São Paulo? Obscura, temida e pouco comentada, influenciou e guiou secretamente a vida da nação durante muitos anos, perturbando a realização de seu verdadeiro destino. Um homem misterioso, que não era nada e foi tudo para os adeptos de sua sociedade oculta. Júlio Frank, cujo misterioso monumento funerário, sob a qual está enterrado, encontra-se na USP, num dos pátios da velha Faculdade de Direito de São Paulo, honra que nenhum de seus grandes mestres até hoje conseguiu. Morreu em 1841. Mas quem era ele? Era esse o seu verdadeiro nome? Cuidamos que não. Que terra o viu nascer? Parece que a Alemanha, mas não se sabe que parte dessa vasta região. A que família pertencia? Ignora-se. Que motivos o trouxeram ao Brasil? Ainda a mesma obscuridade. Sabemos apenas que chegou ao Rio de Janeiro sem o mais pequeno recurso; e que o primeiro carinho, que recebeu nesta terra hospitaleira, foi uma ordem de prisão, e sua primeira morada a fortaleza da Lage no Rio de Janeiro; e isto por uma queixa que dele deu o comandante do navio que o havia conduzido. Após solto, foi trabalhar numa estalagem. Quem diria, que nele se escondia um homem do mais raro conhecimento. Que conhecia a fundo as línguas vivas da Europa, e mesmo a latina e grega; que era hábil geômetra, que conhecia a fundo os princípios do direito público e romano, e que tinha perfeito conhecimento da história antiga e moderna. Pois tudo isso era, e o homem que tudo isso sabia era caixeiro em uma estalagem!
Tal homem não podia conservar-se muito tempo em tal posição, quando outra coisa não fosse, a elevação natural de seu gênio e a consciência de seu valimento não o podiam ter por muito tempo em tão baixo estado. O sr. Júlio Frank retirou-se para a província de São Paulo, vila de Sorocaba, onde abriu aula de francês, inglês, italiano e latim. Pequeno teatro era aquele para seus conhecimentos. Logo depois foi chamado para a cadeira de história na cidade de São Paulo, e deu começo a seus trabalhos. Quem era? De onde vinha? Qual o seu nome e a sua família? Vamos aclarar esse mistério com abundante documentação. No Dicionário Bibliográfico Brasileiro encontra-se: "Júlio Frank. Natural da Alemanha e nascido no ano de 1811, faleceu em São Paulo a 19 de junho de 1841, com 30 anos incompletos, depois de naturalizar-se brasileiro, guardando até o túmulo certo mistério quanto à sua família, sua posição social e até quanto à sua verdadeira pátria, e verdadeiro nome que se supõem não serem os designados. O que é certo é que chegou ao Rio de Janeiro sem que alguém o conhecesse, paupérrimo, sendo logo preso na fortaleza da Lage, por queixa, ou coisa semelhante, do comandante do navio que o trouxe, e, sendo solto, foi caixeiro duma estalagem. Entretanto, conhecia perfeitamente as línguas vivas da Europa, inclusive a latina e a grega, era hábil geômetra e metafísico, tinha profundos conhecimentos de história antiga e moderna, e alguns do direito público e do direito romano. Deixando a estalagem, foi para São Paulo e na vila de Sorocaba abriu uma aula de francês, de inglês, italiano e latim. Já vantajosamente conhecido, foi convidado para exercer na capital o lugar do professor da cadeira de história anexa à Faculdade de Direito, para a qual escreveu o compêndio que passo a mencionar...".

Monumento funerário feito pelos alunos onde foi enterrado Júlio Frank em 1841

Afirmou mais uma vez o mistério que deve ser definitivamente desvendado. Em março ou abriu de 1821, o capitão dum navio chegado da Europa à Guanabara entregou às autoridades policiais um rapaz que embarcara furtivamente num porto alemão, passageiro clandestino, como se diz hoje, o qual deu o nome de Júlio Frank, nada explicou sobre a sua pessoa e foi recolhido à fortaleza da Lage, enquanto talvez se procediam a indagações. Consultamos na Biblioteca Nacional a coleção da "Gazeta do Rio de Janeiro" do ano de 1821 e verificamos que nenhum navio alemão chegou ao Rio em abril. Em março, porém, entraram dois: no dia 13, a galera "Charlota" do capitão João Walff, carregada de vidros e fazendas, vinda de Hamburgo com cento e quinze dias de viagem; no dia 17, o brigue "Indianer" do mestre judeu Berend Meyer, vindo de Bremen com noventa dias... Como a polícia nada apurasse sobre essa figura cheia de mistério", puseram-na em liberdade. Naturalmente, para ganhar a vida se sujeitou ao primeiro emprego que lhe apareceu, o de caixeiro duma estalagem. Em 1823, passou-se para Ipanema e daí para Sorocaba, onde se fez professor de línguas. Naquele tempo, não precisava ser muito profundo em tais matérias para lecioná-las no interior deste imenso Brasil. À provavel proteção do senador Nicolau de Campos Vergueiro, manda-chuva em Sorocaba e grande maçon, que o recomendou ao brigadeiro Rafael Tobias de Aguiar, para que este fosse nomeado professor de filosofia e história universal do Curso Anexo da recente Faculdade de Direito, com a qual de tal maneira se identificou que o "seu túmulo encontra-se no claustro mais íntimo da Faculdade, sendo o seu nome "o mais respeitado às gerações que passaram".
O misterioso homem vinha da Alemanha e a Alemanha se enchia naquele começo do século de sociedades secretas que proliferavam sobretudo nos meios universitários. O que elas faziam está pintado neste trecho do grande escritor que as combateu, Augusto de Kotzebue: "A liberdade acadêmica consiste sobretudo em permitir aos jovens viverem na orgia, se endividando, não freqüentando as aulas senão segundo seus caprichos, vestindo-se como malucos e surrando os burgueses. Os pais de família sensatos deviam tremer no momento de enviar seus filhos à universidade, quando ouvem o relato de tais façanhas nas cervejarias e nas sociedades de ginástica. Antes do que deixá-los pensar que a pátria os espera para se regenerar, melhor fôra ensinar-lhes os rudimentos do que ignoram e a polidez de que não têm a menor idéia".Essas sociedades já se tinham estendido à Itália, especialmente Veneza, à Áustria, à Holanda, à Saxônia, ao Reno, Frankfurt, e até mesmo à América. Augusto Frederico Fernando de Kotzebue, nascido em Weimar em 1761, era um dos grandes homens de espírito que puseram, na Europa aquecida pelas brasas revolucionárias espalhadas por Napoleão, sua vida e sua pena a serviço da causa da Ordem contra a Anarquia, fomentada da sombra, em todos os setores, pelo judaísmo acobertado nas sociedades secretas. Autor de mais de 300 peças teatrais, na maioria representadas com grande êxito, e de muitos romances, fizera na Rússia parte de sua carreira de advogado. Fôra secretário do governador de São Petersburgo, presidente de tribunal na Estônia, diretor do Teatro Alemão da capital e Conselheiro Áulico.
O Czar Alexandre I tornara-se seu amigo. Em 1813, começou na Alemanha, por conta do Czar, que era a grande muralha em que esbarravam judeus e maçons, a campanha de imprensa, que o celebrizaria, contra "as idéias democráticas que os soldados republicanos do Grande Exército Francês tinham trazido nas suas patronas". Cônsul Geral da Rússia em Koenigsberg, trazia o soberano russo ao par do estado dos espíritos. Maçons e judeus vingavam-se, caluniando-o, infamando-o, isolando-o, sepultando-o no silêncio, enquanto faziam retumbar a fama de Goethe e Schiller, sobretudo do primeiro, que se filiara às sociedades secretas e estudava as ciências ocultas, os quais tinham sido companheiros de infância de Kotzebue. Em 1818, fundara a 'Semana Literária', na qual redigia as notícias políticas que o Imperador Alexandre devia ler. Nessa época, a agitação política na Alemanha era muito forte. Após o desabamento do Santo Império, os pequenos principados que o compunham se haviam reunido sob o nome de Confederação Germânica. Mas eram ainda governados por seus antigos príncipes. Os povos censuravam violentamente esses pequenos soberanos por terem faltado às promessas de liberdade que lhes haviam feito para levá-los à guerra contra Napoleão, sob o pretexto de libertar a pátria alemã, porém na realidade com o fim de preservar a Renânia da propaganda maçônica e revolucionária que vinha da França.
Censuravam-nos especialmente por não terem concedido a seus súditos a liberdade de imprensa e o direito de votar impostos, como lhes fôra solenemente prometido. À frente do movimento reformista, os estudantes das universidades do Norte da Alemanha reclamavam os privilégios que lhes haviam sido prometidos quando se alistaram no exército de defesa nacional. Para unir seus esforços, se tinham agrupado em diversas associações que substituíam as antigas corporações escolares. Desde a queda de Napoleão, a poderosa sociedade Tugendbund se feria sem nunca mais poder curar-se de todo do golpe que recebera em 1809, quando o Corso, dono da Alemanha, ordenara sua dissolução. Mas se refundira em três sociedades que se chamaram Teutônia, Burschenschaft e Landsmannchaft. A Burschenschaft era sobretudo composta pelos antigos combatentes das guerras contra Napoleão, que haviam retomado seus estudos, em 1815, na universidade. Compreendia mais ou menos 10 mil membros espalhados particularmente nas cidades renanas. A Landsmannchaft era antes composta de homens do campo, mais pacíficos e de idéias menos avançadas.Por isso, algumas vezes as duas tinham entrado em conflito. Nos seus artigos da "Semana Literária", Kotzebue atacou tanto as doutrinas novas como os escritores que as defendiam. Atacou ainda, com maior veemência, as universidades, o desregramento dos estudantes e suas sociedades secretas. Maurício Soulié e H. Mueller chamam a isso, textualmente, "obra de ódio". Contudo, linhas depois, declaram que o que escreveu contra o sistema das universidades era "mais do que justo". Judeus, maçons, liberais, estudantes votaram a Kotzebue um ódio de morte. "Arranjara tantos inimigos que sua estada na Alemanha se tornara difícil". O valor de um homem de luta se mede justamente pelo número de seus inimigos. O de Kotzebue era imenso. O próprio Goethe escrevia, anunciando-lhe a morte: "É um fenômeno estranho manifestar-se um ódio tal contra Kotzebue, o qual na verdade se descobre em face de seus inimigos: escritores, burgueses e estudantes. Todos se ligam contra o inimigo comum. A coisa acabou mal, como Goethe adivinhara. Kotzebue compreendeu também o perigo a que se expunha. Mudou-se de Weimar para Mannheim, no Grão Ducado de Baden, onde foi brutalmente assassinado, no dia 10 de maio de 1819, pelo jovem estudante Karl Ludwig Sand, natural de Wunsiedel, na Francônia, sorteado em sessão da Burschenschaft para esse efeito e que confessou ter executado o crime conforme as determinações da seita. Abstraindo-se de toda e qualquer romanceação em torno do crime, o que os documentos do processo comprovam é a premeditação a mais completa, aliada à mais vil covardia.

Retrato de August Von Kotzebue, assassinado por Karl Ludwig Sand

O rapaz partiu, em diligência, no dia 9 de maio dormiu em Frankfurt e no dia 10 chegou a Mannheim, apresentando-se logo em casa de Kotzebue, que não recebia pessoa alguma antes de meio-dia. Voltou ao albergue, onde se hospedara, conversou com várias pessoas, falou animadamente contra Kotzebue e tornou à casa do escritor. Apresentou uma carta de recomendação que falsificara, dizem uns que de um amigo da vítima e outros que da própria mãe dela. "Kotzebue pediu ao rapaz que o esperasse numa saleta do andar térreo. Um momento depois, deixando a esposa e uma senhora que viera visitá-la, desceu a escada. Mais uns instantes e ouve-se um grito, seguido dum rumor de luta. Todos correm e dão com Kotzebue caído sob o assassino que o crivava de golpes. Um dos meninos que chegava exclamou: — Vejam, papai brincando de guerra! Aí Sand correu para a porta, ganhou a rua e ajoelhou-se, bradando: — Viva a pátria alemã! O traidor jaz morto! Pereçam assim todos quantos o imitem! Graças, meu Deus, por me terdes permitido realizar tão bela ação! Em seguida abrindo as vestes, enterrou o punhal no peito. Levaram-no ensangüentado e desmaiado para a cadeia. A busca efetuada em sua residência, em lena, descobriu uma espécie de memorandum em que contava como pretendia matar Kotzebue. Durante vários dias, exercitara-se, enterrando um punhal num boneco de palha, que tinha o lugar do coração marcado por um pedaço de lã vermelha. Achou-se uma carta dirigida à sua mãe, na qual dizia: "Esse homem precisa morrer e a mim cabe matá-lo!" Em outra, pedia demissão de membro da Burschenschaft, a fim de não comprometer nenhum de seus companheiros.

Retrato que mostra Karl Ludwig Sand apunhalando August Von Kotzebue

Todavia, espalhara-se o boato de que também fôra encontrada uma lista rubra, na qual o nome de Kotzebue era somente o primeiro dos que deviam ser assassinados. Várias pessoas do partido conservador fugiram, apavoradas, da Alemanha". Sand escapou com vida ao ferimento que se fizera e foi julgado em Mannheim, a 10 de novembro de 1819, numa atmosfera de terror criada pelas sociedades secretas. O tribunal teve de funcionar a portas fechadas, com receio das manifestações da multidão que se amontoava nos arredores e que os poderes ocultos incitavam. O assassino confessou o crime, gabou-se de tê-lo cometido e negou ter qualquer cúmplice. Foi condenado à morte mas adiou-se a execução da sentença, "porque se esperava que morresse antes dos ferimentos", desculpa um tanto forçada.Mas o Imperador da Rússia enviou ao Grão Duque de Baden um ultimato, protestando contra a demora do castigo. Marcou-se a data de 20 de maio de 1820. O sentimento alemão era tão fortemente simpático ao jovem mártir (?) que o carrasco de Mannheim se recusou a efetuar a execução. Foi preciso recorrer ao de Heidelberg, que somente assentiu em se prestar ao trabalho depois que Sand lhe prometeu, em nome de seus camaradas estudantes, que nenhum mal lhe seria feito em represália. A execução fôra anunciada para as nove horas da manhã. A fim de enganar a multidão, foi feita às seis horas num prado às portas de Mannheim, diante das personagens oficiais e de alguns operários madrugadores que iam trabalhar. Sand, conduzido num carro fechado, acompanhado por um pastor, morreu com a mais nobre simplicidade (?). Uma hora depois, a notícia de sua execução se espalhara pela cidade e o prado estava coberto por muita gente que colhia as ervas tingidas pelo sangue do mártir. Aquele campo ficou longo tempo conhecido como o Sandhimmelweg, isto é, o caminho de Sand para o céu. Dizem que sua mãe recebeu 40 mil cartas dos admiradores de seu filho. Durante um ano inteiro, seus camaradas de universidade conservaram o luto, vestindo-se do mesmo modo que ele se vestia no dia em que matou Kotzebue. Foi enterrado no cemitério de Mannheim, ao lado de sua vítima. Sobre seu túmulo estão gravadas as palavras: HONRA E PÁTRIA.

Vista diagonal do monumento funerário de Júlio Frank

Ora, vê-se claramente que o governo de Baden somente se decidiu a agir forçado pela pressão do Czar. Receando a vingança das sociedades secretas, recorreu ao subterfúgio dessa execução fingida e com hora trocada, a qual não pode enganar a ninguém. Enterrou-se qualquer cadáver ou qualquer boneco sob a lousa da HONRA e da PÁTRIA, e deu-se escápula ao mártir protegido pela Burschenschaft, que prestara ao judaísmo maçônico o maravilhoso serviço de desembaraçá-lo de um inimigo do calibre de Kotzebue... Isto foi em maio de 1820. Naquele tempo, as viagens por terra eram lentas e as por mar, às vezes, ainda mais lentas, dependendo dos ventos. Não era raro levar-se um semestre da Europa até aqui. Em março ou abril de 1821, desembarcou no Rio, vindo clandestinamente num barco mercante, o jovem Júlio Frank, sem nome, sem família e sem pátria, figura cheia de mistério. Karl Ludwig Sand era natural de Wunsiedel. Quando se muda de nome, em geral procura-se instintivamente outro nome que tenha qualquer relação consigo. Jacob Frank era outro personagem misterioso, quase da mesma época de Sand, conhecido chefe dos judeus frankistas ou zoharistas, nascido na Polônia em 1720, cabalista terrível, autor do "Zohar", que fingiu converter-se ao cristianismo para miná-lo, que recebia de seus adeptos somas enormes com as quais levava vida luxuosíssima na Europa central e que morreu de um ataque de apoplexia em Hesse, no ano de 1791. Segundo o costume judaico de trocar os nomes, conservando as iniciais, J. F. correspondem a Júlio Frank e a Jacob Frank. É fato averiguado e assentado que esse não era o verdadeiro nome do misterioso indivíduo.
Trouxera uma organização secreta judaica, cujos fins e cujos resultados veremos a pouco e pouco. Karl Ludwig Sand nasceu em 1795. Foi uma criança doente e nervosa. Adolescente, era "dócil, solitário, estudioso e ordinariamente mergulhado numa espécie de apatia, da qual saía para a prática de atos violentos e generosos". Magnífica presa para o satânico misticismo das sociedades secretas. Tipo exato do místico capaz de ir até o crime. São como que os sonâmbulos sobre que atua o hipnotismo das forças ocultas. Voluntário contra Napoleão, Sand combateu em Waterloo e esteve na França até 1816 com o exército de ocupação. Voltou para a Universidade de Erlangen, da qual era estudante, filiando-se com exaltação a Burschenschaft. Contou-nos um antigo membro da sociedade, que se liam nas reuniões uns cadernos em que Júlio Frank contava suas campanhas contra Napoleão. O depoimento é importante. Se está certa a data quando cometeu o crime, em 1819, tinha então 24 anos. Já não era uma criança. Com o nome de Júlio Frank, chegou ao Brasil em 1821. Contava 26 anos. Quando morreu, em 1841, estava, pois, com 46 anos. Os que sobre ele escreveram, fazem-no mais velho, porém que disparidade nas idades que lhe dão? Se Júlio Frank tivesse somente 30, 32 ou 34 anos, quando faleceu, em 1841, teria desembarcado no Rio de Janeiro, em 1821, com 10, 12 ou 14 anos, o que é inadmissível e demonstra que essas idades são dadas para despistar quanto à verdadeira identidade da "figura cheia de mistério". Considerando-o como Karl Ludwig Sand, nascido em 1795, desembarcanda no Rio de Janeiro com 26 anos, idade então que já condiz com a soma de conhecimentos que possuía. Dos 10 aos 14 era impossível possuí-los, salvo se fosse, ao invés de uma "figura cheia de mistério", uma criança prodígio. Por que motivo Júlio Frank deixou rapidamente o Rio de Janeiro e foi parar em Ipanema e, depois, em Sorocaba? August Von Kotzebue, assassinado por Karl Ludwig Sand, deixara vários filhos que foram homens ilustres: o mais velho, Otto, nascido em Reval, em 1787, oficial da Marinha Russa, grande navegador; Moritz, general russo, nascido em 1789 e morto em 1861; Paul, nascido em Berlim, em 1801, general russo, falecido em 1884, após ter feito com brilho as campanhas da Polônia, do Cáucaso e da Criméia, e Alexander, pintor de batalhas.
Foi quando em 1823, surgiu súbitamente no Rio de Janeiro, Otto Von Kotzebue. Comandava a fragata russa "Enterprise", destinada a descobrimentos e explorações. No dia 13 de novembro do ano citado, ancorou à vista da barra devido à calmaria do mar. Entrou na Guanabara no dia 14. Otto Von Kotzebue permaneceu durante 25 dias no Rio de Janeiro, residindo em Botafogo, na casa de um amigo e deixando, na obra que escreveu sobre a viagem, boas descrições da nossa capital, naquele tempo. Voltou para a fragata na tarde de 9 de dezembro e levantou as velas nodia 10, saindo à barra já ao anoitecer.A coincidência é curiosa. Chega o navegador russo inesperadamente e começa a visitar a cidade, então pequena e atrasada; logo, Júlio Frank, o jovem passageiro clandestino e suspeito põe o pé no mundo, afundando-se no interior do Brasil, onde chega em estado de miséria e faminto. Que tinha Júlio Frank a ver com Otto Von Kotzebue, para fugir dele como o diabo da Cruz? Frank, evidentemente, não devia ter nada. Mas era esperado que Karl Ludwig Sand não desejasse de forma alguma encontrar-se com o filho do homem que havia covardemente assassinado...Durante longos anos, não se falou em Burschenschaft no nosso país. Raríssimas pessoas desconfiavam da existência de uma organização secreta e poderosíssima em São Paulo ou sabiam alguma coisa a esse respeito. O túmulo de Júlio Frank nem despertava a atenção. A revolução de 1930 acordou as curiosidades. Apareceram boletins e artigos tocando no mistério e, em 1935, um jornalista carioca escreveu o seguinte: "No saguão do antigo edifício da Faculdade de Direito deSão Paulo, existe um único túmulo, que é o do judeu alemão, professor contratado de história, organizador da Burschenschaft no Brasil. Durante a revolução de 1930, esse túmulo foi misteriosamente violado, ao que dizem, para retirarem de lá os primitivos estatutos e atas de organização, a fim de que tais documentos ultra-secretos escapassem ao conhecimento do público". Não parece verdade que o túmulo tenha sido violado, mas é verdade que sobre ele paira o mistério. Dizem que há documentos preciosos guardados na sua base. De fato, é conservado com extremo carinho. Ainda quando da recente derrubada do velho convento onde funcionava a Faculdade desde sua fundação, foi todo protegido por uma armação de madeira e mantido no mesmo local. Ele copia nas suas linhas gerais outro monumento misterioso de São Paulo, a Pirâmide do Piques, que data de 1814, anterior à Burschenschaft e situado em frente ao local onde outrora funcionou a loja maçônica mais influente nos destinos paulistas. Muitas vezes, nos momentos de perturbação da ordem pública, aquela pirâmide tem sido guardada até por militares armados, como se sob suas pedras centenárias dormisse um segredo perigoso... O mistério que envolveu a vida de Júlio Frank ou Karl Ludwig Sand acompanha-o além da morte. O certo é que chegou ao Rio de Janeiro paupérrimo, sem que ninguém o conhecesse, sendo logo preso na fortaleza da Lage, por queixa, ou coisa semelhante, do comandante do navio, que o trouxe, por haver embarcado furtivamente. Solto, veio para Sorocaba empregando-se como caixeiro numa venda.
Segundo outra versão, abriu ali uma aula de francês, inglês, italiano e latim. De Sorocaba veio para São Paulo, recomendado ao brigadeiro Rafael Tobias, e entrou para o Curso Anexo. De extrema bondade, cheio de idealismo, conquistou para sempre a mais terna afeição da mocidade, e por isso o seu nome se venera ainda na Academia, como o maior e o mais devotado amigo dos estudantes. Não chegou a cumprir inteiramente o contrato de dez anos, pois faleceu aos 19 de junho de 1841, sendo substituído, na cadeira de história universal, por seu discípulo, e amigo, Antônio Joaquim Ribas. O túmulo de Júlio Frank é um catafalco sobre plataforma quadrilátera, à qual dão acesso alguns degraus, encimado por um obelisco de cerca de quatro metros. Todo o monumento, de cantaria, está amparado por gradil de ferro, preso, nos ângulos, a quatro pilastras adornadas por mochos simbólicos. Fica situado exatamente em frente à sala, hoje modificada, em que lecionava. Numa das faces do pedestal, há o seguinte epitáfio:

HIC JACET JULIUS FRANKIN IN HAC PAULOPOL. ACADEM. PUBL. PROF.NATUS GOTHAE. ANN. MDCCCIXOBIIT XIX JUNII ANN. MDCCXLIAETATE SUAE XXXIIO


monumento foi feito a expensas de alguns acadêmicos, que também mandaram pintar-lhe o retrato a óleo, — hoje na sala de leitura da Biblioteca. A data do nascimento atribuída ao morto é uma inverdade manifesta. Se ele tivesse nascido em 1809, teria desembarcado no Rio de Janeiro, em 1821, com 12 anos e estaria, em 1823, com 14, dando lições até de latim em Sorocaba, o que não entra na cabeça de ninguém. Todos confessam o mistério de sua procedência e de sua família; todos afirmam que trocara o nome. Frank aparece como personagem em um romance barato, do sr. Afonso Schmidt nos folhetins do "Estado de São Paulo", com o intuito de estabelecer a confusão sobre o personagem, cuja identidade não convém aclarada. Essa confusão se estabelece sobretudo nas datas variáveis do nascimento, o que é de importância capital: 1808,1809 e 1811, todas tendentes a afastar a hipótese de ter assassinado Kotzebue em 1819. O grande segredo da Burschenschaft!Sabendo-se que Júlio Frank chegou ao Rio de Janeiro em 1821, isto torna patente o absurdo da data que se quer impor para seu nascimento. O mal arranjado romance do sr. Afonso Schmidt, publicado no "Estado de São Paulo" tem por escopo naturalmente desviar a opinião pública da verdade sobre o misterioso personagem. Nada mais. Contudo, de vez em quando, nele afloram uns pedacinhos da verdade. Entre estes, a referência de que Júlio Frank ou Karl Ludwig Sand era judeu... A novela do "Estado de São Paulo", que traz estas revelações importantes, baseia-se em investigações do sr. Frederico Sommer sobre Júlio Frank. Dizem elas o seguinte: nasceu a 8 de dezembro de 1808, na cidade de Gotha, segundo o registro da igreja protestante local de Santa Margarida, filho de um mestre encadernador; cursou o ginásio de Gotha; estudou na Universidade de Goettingue de 1825 a 1827; fugiu da Alemanha por causa de dívidas e desgostos, vindo para o Brasil. Em Sorocaba, apareceu Frank descalços e somente com a roupa do corpo. Caixeiro de venda, divertia-se em chamar escolares e ajudá-los nas lições, quaisquer que fossem. Foi caixeiro despedido por não dar sossego às garrafas de álcool, a latas de passas e azeitonas. Dinheiro era para Frank coisa alguma, mas o "patrão" dele tinha outras idéias em Economia Política.

Retrato em que aparece August Von Kotzebue logo após ser covardemente apunhalado

De Sorocaba partiu Frank para São Paulo, agasalhado aí em repúblicas de acadêmicos, ora numa, ora noutra, até ser nomeado professor de história do Curso Anexo à Faculdade de Direito. Preciosas notas recolhidas por um "Velho Sorocabano", Lopes de Oliveira, de parentesco com o Dr. Francisco de Assis Vieira Bueno, discípulo de Frank, habilitam-nos a apreciar até o tipo físico do professor "alemão". Frank de estatura mediana, cabelos louros, de olhos azuis, usando barba. Andava sempre de mãos cruzadas sobre as costas, palmas abertas, dedos entesados. Muito supersticioso, prestava atenção a crendices e práticas indígenas, nem se furtava a sessões de magia negra... Procurando falar à paulista, descansadamente, radiava de alegria se lhe perguntavam onde nascera em São Paulo, gostando muito quando o chamavam de Lamão na cidade pequenina de onze mil almas. Dava Júlio Frank lições particulares em casa. Professava magistralmente no Curso Anexo da Faculdade, então dirigida pelo senador Vergueiro. Andava sempre com estudantes e estes o impediam quanto podiam de entregar-se a libações. Admitindo o nascimento desse homem em 1808, o teríamos em 1827 com 19 anos ao deixar a Alemanha, e, ao ser nomeado em 1830 para o Curso Anexo da Faculdade de São Paulo, com 22 anos. Devemos confessar que é muito pouco para quem já sabia tanto... Não queríamos fazer a afirmação categórica de Julio Frank ser Karl Ludwig Sand, o assassino de August Von Kotzebue, sem termos a nossa consciência tranqüila. Para isso, procuramos um de nossos maiores amigos, cujo nome somos obrigados a calar, homem distintíssimo, cidadão prestimoso, grande brasileiro o qual, àquele tempo, segundo sabíamos de fonte limpa, pertencera a Burschenschaft da Faculdade de São Paulo, onde se formara, ocupando na mesma, nos últimos tempos da monarquia, um das posições mais importantes. Sua vida limpa e sua ação patriótica de há muito já apagaram esse erro de sua juventude republicana. Pedimos-lhe esclarecimentos sobre a Burschenschaft e ele nos disse que havia pronunciado um JURAMENTO TERRÍVEL a que não podia faltar. O juramento ritual é o seguinte: "Juro, sob pena de ser considerado infame, que jamais revelarei a existência de uma sociedade secreta na Academia de São Paulo!"
Insistimos, mostrando-lhe a necessidade de esclarecer tais podres segredos aos brasileiros.
Expusemos-lhe a dúvida angustiosa que poderia permanecer em nosso pensamento, se não tivéssemos uma confirmação plena daquilo que os documentos nos revelavam. E ele somente acedeu em nos responder a esta pergunta:
— QUEM ERA NA VERDADE JÚLIO FRANK?
Pensou um instante e confessou:
— ESSE ARCANO SÓ SE REVELAVA NA POSSE DOS NEÓ-FITOS. O PRESIDENTE LIA, ENTÃO, O HISTÓRICO DA BURSCHENSCHAFT E DIZIA O GRANDE SEGREDO: JULIO FRANK ERA SIMPLESMENTE KARL LUDWIG SAND, O ASSASSINO DE AUGUST VON KOTZEBUE!
Somente assim se compreende o mistério e o prestígio desse homem, que teve dois nomes e dois túmulos: um na Alemanha e o outro no Brasil... Quem primeiro se referiu publicamente a Burschenschaft paulista e deu a entender sua ligação com o crime de Sand foi o líder católico Felício dos Santos, em um artigo na "União", que causou grande impressão no espírito público e alvoroço nos arraiais da secretíssima sociedade. O chefe da Burschenschaft nesse tempo era o sr. Vergueiro Steidel, que enviou um emissário ao sr. Felício dos Santos, segundo é do conhecimento de muitas pessoas ainda vivas. Mais tarde, voltava o notável batalhador da Igreja ao assunto nestes termos: "Não há muito tempo, contei aos meus leitores o que era a maçonaria acadêmica de São Paulo, a misteriosa "bushhafft", fundada pelo professor de história, Dr. Frank, jacobino alemão emigrado para o Brasil depois do célebre assassinato de August Von Kotzebue pelo estudante Karl Sand em 1819. Quase todos os estudantes da Faculdade de São Paulo eram filiados a essa associação."

Karl Ludwig Sand ou Júlio Frank como preferirem, apesar dos retratos não apresentarem muitas semelhanças


Túmulo de Karl Ludwig Sand na Alemanha onde não se sabe ao certo o que ou quem está enterrado

A nossa documentação esclarece definitivamente o assunto e comprova tudo quanto deixamos dito acerca do bacharelismo judaizado que tomou conta do Brasil e o levou à amoralidade política e social. A mocidade brasileira precisa destruir os resultados dessa ação das trevas que abastardou a nação. Para esmagar uma seita, diz o padre Barruel, uma das maiores autoridades em matéria de sociedades secretas, é necessário atacá-la nas suas próprias escolas, dissipar o seu prestígio, demonstrar o absurdo de seus princípios, a atrocidade de seus meios e, sobretudo, a infâmia de seus mestres. Que os homens dignos, de caráter, patriotas e conscientes, cristãos e puros, destruam de vez essa máfia celerada, acocorada na sombra, que dirigiu a vida de São Paulo e o destino da Pátria, servindo-se dos que iniciou nos seus mistérios, os quais não sentem queimar-lhes as faces o rubor da vergonha de subirem por essa triste e suja escada de serviço!